terça-feira, 13 de março de 2012

EUCLIDES DA CUNHA

Assim se erigiu recentemente a Ilha de Cururu, com dois km² de
área; e se reconstroem todas as que se observam acima dos canais de

Breves.

Mas formam-se para se destruírem, ou desocarem-se incessantemente.

As ilhas trabalhadas pelas mesmas correntes que as geraram,

desbarrancam-se a montante e restauram-se a jusante, e vão lento e

lento derivando rio abaixo, ao modo de monstruosos pontões

desmastreados, de longas proas abatidas e pôpas altas, a navegarem

dia e noite com velocidade insensível. Por fim, desgastam-se e

acabam. A de Urucurituba durou dez anos (1840-1850) mercê da

superfície vastíssima; e apagou-se numa enchente...

O mesmo fato, nas margens. Os litorais do Amazonas mal lhe definem a

calha desmedida. São margens que evitam o rio. Ficam-lhe,

normalmente, fora das águas, para além das vastas planuras

salpintadas de “lagos de terra firme”, que atenuam, feito

compensadores, a violência das caudais, nas cheias. Aí, num cenário

mais amplo, se desdobra por vezes a aparência de uma construção, em

larga escala, de solo. O rio, multífluo nas grandes enchentes, vinga

as ribanceiras e desafoga-se nos plainos desimpedidos. Desarraiga

florestas inteiras, atulhando de troncos e esgalhos as depressões

numerosas da várzeas; e nos remansos das planícies inundadas,

decantam-se-lhe as águas carregadas de detritos, numa colmatagem

plenamente generalizada. Baixam as águas e nota-se que o terreno

cresceu; e alteia-se de cheia em cheia, aprumando-se as “barreiras”

altas, exsicando-se os pantanais e “igapós”, esboçando-se os

“firmes” ondeantes, para logo invadidos da flora triunfal... até que

num só assalto, de enchente, todo esse delta lateral se abata.

Numa só noite (29 de julho de 1866) as “terras caídas” da margem

esquerda do Amazonas desmoronaram numa linha contínua de cinqüenta

léguas.


À MARGEM DA HISTÓRIA 

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